Cr 009 - Madrugada Eleitoral

Enquanto aguardava pelo início de mais um dia, via a neblina dissipar-se; o sol surgia amarelando a manhã... Era o primeiro dia da campanha política. Lembro com precisão de alguns amigos que lançaram-se candidatos. Alguns movidos por interesses puramente particulares; outros, tinham de fato algum pensamento em prol as pessoas e poderiam, se eleitos, desenvolver algo útil para a sociedade em suas atividades parlamentares.
Memórias revolveram meus pensamentos. Quando criança, jogava bolinha de gude com alguns amigos e observava um homem pintando um muro. E ele seguiu caiando em branco um comprido muro, deixando-o em destaque naquela rua sem calçamento! Poucas eram as casas que tinham passeio pavimentado, e do meio da quadra até a esquina, todo o muro estava como novo. Comemorávamos esse fato! A alegria da meninada era maior e até o pega-pega era mais divertido com o muro “novo”! Passado alguns dias, pintaram dizeres dum candidato e de seu partido. A decepção foi geral! Nós questionávamos, a nosso modo, porque motivo alguém fizera aquela barbaridade! Sujar um muro que estava tão bonito... Tava como novo! E chegou alguém para sujar...
Agora, alguns anos mais tarde, estava a caminho do meu local de serviço. Um carro de sonorização, posto em volume alto, transmitia publicidade eleitoral. Atravessando uma praça, lá havia outro similar. Escutei alguns reclames bem elaborados, onde o candidato era até valorizado pela qualidade da produção; outros, sem muitos recursos, faziam alguns spots de menor qualidade. Os custos de produção, ficando a cargo dos partidos, dependem da capacidade econômica de cada candidato. E nisso há disparidades. Alguns informes ficam com alta qualidade, destacando-se dos demais e outros tornam-se peças terríveis. Mas, os jingles tocavam e em cada canto da cidade havia música, falatório e barulho de candidatos! Uma festa na qual os convivas são forçados a participar, considerando que não há como deixar do lado de fora, de nossas casas – e de nossas vidas –, o som alto dos carros de publicidade!
Pedalando, minha bicicleta amassava panfletos e seguia em meio a outras sujeiras eleitorais. Nessa época de campanha, muitos candidatos dirigem-se aos eleitores e oferecem auxílio, até mesmo em dinheiro ou pagamento de contas de água e luz. Esses mesmos candidatos, que ora tentam comprar o nosso voto, se eleitos procuram encher novamente os bolsos com dinheiro público. Aceitar o auxílio pode até ser interessante num primeiro momento; porém, dignidade não é algo que se compre; Dignidade é algo para exercitarmos diariamente, em busca do nosso auto-aprimoramento como seres humanos. Não permitamos que esses velhacos venham nos aliciar com suas propostas indecentes!
Todos estão poluindo nosso meio ambiente, de alguma forma. Nossas ruas ficam cheias de publicidade de gosto e teor duvidosos. Em qualquer parede pintam seus dizeres, numa sopa de siglas, cujo significados existem somente em discursos e que distanciam as pessoas comuns das associações de caráter político. Por todos os cantos ouve-se plágios de melodias, na qual exaltam o candidato e ferem direitos autorais dos compositores. Em nossas ruas encontramos papéis de publicidades eleitorais que entupirão bueiros numa próxima chuva.
Das funções que existem numa sociedade, a de funcionário público em cargo eletivo me parece a que desperta maior egocentrismo, porque quase todos se julgam como a “salvação da lavoura”. Estamos sempre com os mesmos tipos de problemas, na ordem: desemprego, violência, saúde, educação... Normalmente, as promessas surgem porque reclamamos. Poderíamos, desta vez, não reclamar de nada para nenhum deles. Eliminando as oportunidades que hoje eles têm de nos enganar, poderíamos votar no candidato que menos sujeira fizesse em todos os aspectos.
Uma lufada vinda de leste levantou papéis da sarjeta em minha direção. Parei para observar de qual dos pretendentes seria, e descobri que eram dos três concorrentes ao mesmo cargo! Interessante... No final, em igualdade de condições e atitudes, encontraram-se no mesmo local!